O terceiro dia da Missão Internacional do Transporte – Japão 2025 trouxe lições estratégicas sobre o uso de tecnologias avançadas no setor de transporte, com foco em inovação, transformação digital e sustentabilidade. Em um contexto de rápidas mudanças tecnológicas, as palestras abordaram como adaptar estruturas organizacionais, acelerar a digitalização e manter a ética e a responsabilidade socioambiental no centro das decisões corporativas.
A programação foi aberta por Michael Wade, professor do IMD e diretor do Centro Global para Transformação de Negócios Digitais, com a palestra “Tecnologia avançada em transporte: construindo estratégia e impulsionando a execução”. Wade destacou que, para que a tecnologia gere valor real, é essencial alinhá-la a objetivos estratégicos bem definidos, além de encontrar o equilíbrio entre estrutura e flexibilidade organizacional.
Segundo ele, isso só é possível ao orquestrar toda a cadeia de valor da empresa. “Funciona exatamente como uma orquestra, na qual cada área precisa executar sua parte de forma ritmada – desde o desenvolvimento de produtos até os processos de TI, com foco no cliente e na força de trabalho”, explicou.
Etapas da transformação digital
O professor apresentou os quatro estágios da jornada digital: Silo, Caos, Burocracia e Agilidade Ancorada. Segundo ele, muitas empresas ficam estagnadas nos estágios iniciais – seja por uma euforia desorganizada, sem alinhamento estratégico, seja por dificuldades na estruturação de processos internos.
O objetivo, afirmou, deve ser alcançar o estágio de agilidade ancorada, no qual a organização atinge um equilíbrio entre escalabilidade, controle e capacidade de adaptação contínua. “A tecnologia é um catalisador, mas ela só será eficaz se tiver um propósito bem definido”, alertou Wade ao citar o exemplo da empresa Zurich, que estagnou na fase de “caos” digital por resistência interna à mudança.
Um dos cases analisados foi o da Caterpillar, que enfrentou dificuldades ao tentar integrar suas máquinas ao sistema digital Cat Connect sem, inicialmente, oferecer um valor percebido pelo cliente. A virada de chave veio com o reposicionamento da estratégia, focando na oferta de serviços segmentados e em resultados tangíveis para os usuários, o que permitiu gerar impacto real e ampliar a adesão à solução digital.
Cultura Zen e gestão empresarial
O workshop “Desacelere para se mover mais rápido: Zen para o domínio do eu resiliente” apresentou um conceito que, à primeira vista, pode soar contraditório, mas, como os participantes perceberam, faz toda a diferença na prática. Afinal, é possível ganhar agilidade ao desacelerar?
Conduzida por Daiko Matsuyama, sumo sacerdote do Templo Zen Budista Taizo, a atividade explorou como os princípios da filosofia Zen, baseados em bem-estar, consciência plena e disciplina, vêm influenciando a cultura corporativa japonesa há décadas.
Lições como visão de longo prazo, equilíbrio entre tradição e inovação e cautela nas decisões foram destacadas como fundamentos de empresas centenárias. Não por acaso, o Japão lidera o ranking mundial de companhias com mais de cem anos de existência, reflexo direto da adoção consistente desses valores no ambiente de negócios.
Como funciona o transporte no Japão?
Uma das principais dúvidas dos participantes foi sobre a estrutura do sistema de transporte japonês. O tema foi abordado por Ryukichi Miyabayashi, diretor associado do IMD, que apresentou uma visão abrangente sobre o modelo de operação adotado no país, com destaque para as fontes de financiamento.
Ao contrário do que ocorre no Brasil, o governo japonês não subsidia diretamente as empresas de transporte. No entanto, oferece apoio estratégico para operações locais, especialmente em áreas de baixa demanda, e atua fortemente na reconstrução de infraestrutura após desastres naturais.
Miyabayashi também destacou os incentivos à acessibilidade e à sustentabilidade, com linhas de crédito específicas voltadas à modernização da frota e à adoção de tecnologias limpas. Ele destacou o papel da cultura Kaizen (melhoria contínua) como diferencial competitivo. “No Japão, a inovação não se baseia em grandes rupturas, mas na busca diária por aperfeiçoamento”, afirmou.
Tecnologia, ética e sustentabilidade: o papel do setor transportador
Encerrando o dia, Michael Wade expôs dilemas éticos da automação e da inteligência artificial. Questões como a substituição de humanos por robôs, a privacidade no ambiente de trabalho e os impactos sociais da implantação de tecnologias avançadas foram debatidos.
Para o setor de transporte, a digitalização abre oportunidades para reduzir a poluição, otimizar rotas, economizar combustível e melhorar o planejamento logístico por meio de simulações e monitoramentos em tempo real. Porém, o especialista reforça: “É preciso que essas transformações estejam ancoradas em práticas responsáveis, com foco na transparência e no benefício coletivo”.
Ao término do evento, ficou a mensagem de que a modernização do setor transportador exige mais do que tecnologia. É necessário repensar culturas organizacionais, investir em treinamento para as pessoas, estruturar processos e garantir que a inovação seja incentivada a serviço do desenvolvimento sustentável e ético. O desafio está lançado para os empresários brasileiros: transformar o transporte local com propósito e consciência.
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